Manhã dedicada ao daltonismo sensibiliza os mais pequenos da EB de Torres Vedras
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A semana começou de maneira diferente para as crianças do 1º ciclo da Escola Básica de Torres Vedras. Aos rastreios visuais que visavam despistar algum tipo de daltonismo, as turmas dividiram-se em pequenos grupos para passarem por uma experiência única: à volta de uma mesa e colocando óculos preparados para o efeito, as crianças puderam ver e sentir como se fossem daltónicos.

A torriense Óticas-OCT juntou-se ao ColorADD, o projecto de Miguel Neiva que, através de um código, faz com que os daltónicos consigam identificar as cores. A acção pretendia sensibilizar, desde cedo, para a realidade do daltonismo, uma limitação que, tal como referiu o designer e Professor da Universidade do Minho, “não é visível aos olhos dos outros.”

Manhã dedicada ao daltonismo sensibiliza os mais pequenos da EB de Torres Vedras

Esta é a segunda vez que o projecto visita o concelho. Depois da Ventosa, hoje foi a vez de alunos e professores desta escola de Torres Vedras ficarem a conhecer melhor a realidade do daltonismo, numa manhã que contou com a presença de Laura Rodrigues, Vice-Presidente da Câmara Municipal de Torres Vedras e responsável pela Educação. “Felizmente, ainda não houve ninguém que tivesse manifestado dificuldade na cor” refere Luís Góis, director-geral das Óticas-OCT, que integram o grupo Instituto Óptico, parceiro do sistema inovador. “Mais do que o número” de casos que são diagnosticados nos mais novos, realça “o impacto que tem na sua vida escolar e no seu dia-a-dia.”

Miguel Neiva trouxe consigo a equipa que forma o ColorADD, que brindou as crianças com actividades de sensibilização. A meio da manhã a pequenada aproveitava o intervalo no recreio. Dentro da sala, era agora a vez das professoras terem um momento de formação sobre o tema. O mentor do projecto reforçou que o seu sucesso “muito se deve aos professores que nos têm acompanhado” e rapidamente partiu para a análise do fenómeno: 350 milhões de pessoas, em todo o mundo, são daltónicas. “A conotação da palavra ‘daltónico’ é má” alerta, sublinhando a importância de acções como esta que se multiplicam dentro e fora do país.

Manhã dedicada ao daltonismo sensibiliza os mais pequenos da EB de Torres Vedras
Alguns números sobre o daltonismo. Dados fornecidos pela ColorADD.

“Não sou daltónico e acho que isso faz com que este projecto tenha o impacto que está a ter. Mostra que somos muito mais competentes se fizermos as coisas a pensar nos outros” conta Miguel Neiva ao Torres Vedras Web. Designer gráfico de formação, faz-nos perceber como tudo começou. “Sempre acreditei que o design tinha a competência de poder tornar o mundo melhor.” Tendo no horizonte o conceito de “design para todos” e consciente de que “nada existia no mundo que pudesse resolver o problema do daltonismo” deu início a uma investigação que viria a decorrer durante oito anos.

A partir da noção de que cor e forma garantem universalidade na linguagem e, excluindo à partida a primeira, restava trabalhar a forma. Assim, a cada cor primária foi atribuído um símbolo gráfico, sendo que através desses três símbolos e das suas conjugações, o daltónico consegue identificar todas as cores. O sistema foi testado em mais de 250 âmbitos e validado cientificamente em 2009. Seguiu-se o trabalho com diversas empresas e organizações. Hoje, o código está a ser implementado em etiquetas de diversas marcas de roupa, lápis de cor, bibliotecas, hospitais e meios de transportes (como no Metro do Porto).

“Isto mexe, de facto, com a vida das pessoas”

“O que fiz foi criar soluções simples e fáceis para que toda a gente possa entender.” Parece simples a missão que rege Miguel Neiva e o ColorADD, que resume o sistema em “dar ao daltónico a possibilidade de ele utilizar uma ferramenta sem que tenha de pagar por ela e sem que tenha de assumir a sua condição.” No fundo, conclui, trata-se de “incluir sem discriminar.”

Manhã dedicada ao daltonismo sensibiliza os mais pequenos da EB de Torres Vedras
Miguel Neiva, designer e Professor da Universidade do Minho, lidera o projecto ColorADD.

Ao reconhecimento das Nações Unidas como Melhor Aplicação Inclusiva do Mundo, o projecto e o seu criador somam distinções, condecorações e prémios, a nível nacional e internacional. Mas o reconhecimento dito “oficial” parece ser facilmente superado pelo contacto directo com quem viu o seu dia-a-dia melhorado através deste sistema. “Há uma criança na Argentina que reza por mim todas as noites. A mãe contactou-me através das redes sociais e eu enviei-lhe uma série de ferramentas. Agora todos os anos pelo meu aniversário recebo desenhos e velinhas” conta, acrescentando que “todos os dias recebo emails de mães a agradecerem porque o filho deixou de ser discriminado na escola.”

“A minha vida é totalmente dedicada a este projecto, há quatro anos que não durmo cinco dias seguidos em casa. Tanto estou aqui em Torres Vedras como vou agora para a Índia fazer exactamente isto.” Dedicação e paixão parecem ser a chave para o sucesso deste projecto. “Esta é a minha maneira de estar na vida.”

Com o sol a espreitar e com o recreio da EB de Torres Vedras mais vazio, Miguel Neiva admite que “até o modelo de negócio é inovador e justo. As empresas para utilizarem um código nos seus produtos pagam-nos uma licença de utilização, mas esse valor é indexado à dimensão das empresas.” Confessa que já rejeitou várias propostas de exclusividade em áreas de negócio e sublinha que se trata de um projecto “democrático”. “É um projecto para as gerações futuras que tem de ser implementado naturalmente, tal como uma árvore.”

O ColorADD encontra-se na fase final do Chivas The Venture, mostrando que uma empresa “consegue ter um potencial transformador e grande impacto social, com retorno económico – que não é o objectivo, é uma consequência.” Miguel Neiva vê a participação no concurso mundial de empreendedorismo como “uma porta para o mundo.” Depois dessa porta, as expectativas não poderiam ser outras. “Espero um futuro ainda mais colorido para todos.”

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Rita Alves dos Santos
Jornalista. Natural de Torres Vedras. Licenciada em Ciências da Cultura na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e Pós-Graduada em Jornalismo Multiplataforma. Mestranda em Jornalismo da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa.

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