Quase dois terços dos inquéritos de violência doméstica que entraram no Ministério Público em 2014 foram arquivados, revelou hoje a coordenadora da 7.ª secção do Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) de Lisboa.
“Em 2014, tivemos 2.360 entradas de inquéritos de violência doméstica, foram acusados 252, suspensos 206 e arquivadas 1.527”, disse a procuradora Maria Fernanda Alves no seminário “Violência nas relações íntimas e contra pessoas especialmente vulneráveis”, promovido pelo DIAP.
A média de entrada, em 2014, situou-se em 196 inquéritos mensais, tendo transitado para este ano 1.281 investigações.
Para Maria Fernandes Alves, é preciso encontrar formas de investigação que permitam “ultrapassar este número elevado de arquivamentos [36,7%]”.
A procuradora explicou que “muitos dos arquivamentos ocorrem porque a vítima não colabora, não há testemunhas e as testemunhas também não falam”.
Por isso, defendeu, a vítima tem de ser apoiada durante a fase do inquérito para “poder colaborar”.
Entre 01 de janeiro e 30 de novembro deste ano, dos processos que foram a julgamento, resultaram 52 condenações com pena suspensa, sete prisões efetivas e 28 absolvições.
Maria Fernanda Alves adiantou que este ano as queixas de violência doméstica “baixaram sensivelmente”.
Até à data, deram entrada 1.642 inquéritos de violência doméstica, 153 de maus-tratos a menores e 80 de maus-tratos a idosos.
Outubro e novembro foram os meses que registaram maior número de queixas: 357 por violência doméstica, 18 por maus-tratos a menores e 15 por maus-tratos a idosos.
Para a procuradora, a violência contra as mulheres, crianças, idosos e vítimas especialmente vulneráveis é “um problema persistente”, cuja prevenção e combate tem de “ganhar cada vez mais relevância e eficácia nos seus resultados”.
“A violência não é uma inevitabilidade”, disse, defendendo que a prevenção tem de passar pela “alteração de valores, comportamentos e atitudes” e ser feita de uma “forma continuada” e transversal nos currículos escolares.
Maria Fernanda Alves considerou ainda que “as ações de prevenção isoladas não têm qualquer significado”, defendendo a criação de redes de apoio comunitário especializadas e a definição de um modelo de intervenção integrada sobre violência.
Para a procuradora, é necessário continuar a investir na formação específica dos magistrados do Ministério Público, dos funcionários judiciais, dos magistrados judiciais e dos órgãos de polícia criminal.
“Já são conhecidas muitas condenações com penas de prisão efetivas e severas”, mas ainda são “insuficientes para a prevenção geral”, disse, acrescentando que muitos magistrados judiciais “ainda não estão sensibilizados para a aplicação de penas acessórias”, o que contribuiria para evitar casos de reincidência.
Considerou ainda que a “resposta eficaz” a esta problemática passa pela articulação de todas as entidades que trabalham no terreno de “forma célere e complementar”, tendo em vista além da punição do agressor encontrar soluções adequadas para reparar ou minorar o sofrimento das vítimas.